quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Os 7 Povos das Missões

No século XVI e princípios do século XVII, os padres jesuítas espanhóis fundaram aldeias, denominadas de missões, orientadas pela religião católica, onde os índios viviam de acordo com os princípios da cultura ocidental na região oeste do território, hoje pertencente ao Brasil, Uruguai, Paraguai e à Argentina.

Foram criados sete povoados, que ficaram conhecidos como os “sete povos das missões”. A etnia desses povos era variada, nela predominando os traços dos índios guaranis.

Os “Sete Povos” eram formados pelas aldeias de São Francisco Borja (1682), São Nicolau (1687), São Luiz Gonzaga (1687), São Miguel Arcanjo (1687), São Lourenço Mártir (1690), São João Batista (l697) e Santo Ângelo Custódio (1707), nas terras do Rio Grande do Sul.

São Miguel, uma das mais antigas missões dos Sete Povos, foi o primeiro lugar a ser tombado pelo IPHAN, como símbolo de agregação territorial, unidade nacional e identidade do povo gaúcho.

Nessas ruínas há uma igreja que contém o único exemplar de torre e frontaria remanescentes dos povos jesuíticos e dos índios guarani que se localizavam, nos séculos XVII e XVIII, no Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai.

Lá se encontram restos de paredes, de fundações e de pavimentação de várias construções, casas de padres e de índios, oficinas, colégios e cemitérios, testemunhos notáveis da primeira civilização implantada por europeus. É de destacar as características sociais, econômicas, culturais e religiosas inovadoras e inexistentes na época.

A construção da Igreja de São Miguel Arcanjo teve início em 1735 e foi concluída dez anos depois, sob a condução do arquiteto italiano, padre jesuíta, Grean Battista Primoli. A igreja possuía três naves com cinco altares dourados, cobertos de imagens de santos, em pedra e madeira, todas elas talhadas pelos próprios índios.

Construída com grandes blocos de pedras, alguns com cerca de mil quilos, assentados uns sobre os outros graças a um recorte tecnicamente bem calculado. Do lado direito da frontaria da igreja há uma torre com 25 metros de altura, onde originalmente havia cinco sinos.

Um deles, pesando mil quilos, encontra-se ainda no museu existente junto às ruínas. Acredita-se que esse e os demais sinos tenham sido fundidos na missão de São João Batista, onde se instalou a primeira fundição da América Latina.

Na análise de Darcy Ribeiro em As Américas e a Civilização, as missões representam “a tentativa mais bem sucedida da Igreja Católica para cristianizar e assegurar um refúgio às populações indígenas, ameaçadas de absorção ou escravização pelos diversos núcleos de descendentes de povoadores europeus e para organizá-las em novas bases, capazes de garantir sua subsistência e seu progresso”.

Em 1983 reconheceu-se São Miguel como um dos patrimônios da humanidade por representar um testemunho histórico do Novo Mundo, gerado pela expansão européia do século XVII e pela ação inovadora dos jesuítas.

O nome São Miguel Arcanjo significa “o que está com Deus”. Chefe dos Exércitos celestiais e padroeiro da Igreja Católica Universal, São Miguel representa o anjo do arrependimento e da justiça, tendo sido mencionado três vezes na Bíblia Sagrada:

No capítulo 12 do livro de Daniel está escrito: “Ao final dos tempos aparecerá Miguel, o grande príncipe que defende os filhos do povo de Deus. E então os mortos ressuscitarão, os que fizeram o bem, para vida eterna, e os que fizeram o mal para o horror eterno”.

No capítulo 12 do livro do Apocalipse lê-se: ”Houve uma grande batalha no céu. Miguel e seus anjos lutaram contra satanás e suas legiões que foram derrotadas, e não houve lugar para eles no céu. A antiga serpente, o diabo, o sedutor do mundo foi atirado no precipício.

Ai da terra e do mar, porque o demônio desceu a voz com grande ira, sabendo que lhe resta pouco tempo”. Na carta de São Judas consta: “O Arcanjo Miguel, quando enfrentou o diabo, disse que o Senhor o condene”. Por isso São Miguel apareceu muitas vezes atacando o dragão infernal”.

É interessante referir que o nome desse guerreiro dos exércitos celestiais encontrava-se exatamente no local onde ocorreriam as mais sangrentas batalhas de uma guerra do período colonial, as Guerras Guaraníticas.

Dá-se o nome de Guerras Guaraníticas para o episódio de cruel massacre dos nativos e de seus amigos jesuítas por soldados de Portugal e Espanha, ocorrido nas terras do Rio Grande do Sul em decorrência das decisões expressas no Tratado de Madri.

Durante o século XVII o movimento missionário enfrentou problemas na América do Sul, em áreas de litígio entre colonialismo espanhol e português. No Sul do Brasil, a população indígena dos Sete Povos das Missões foi submetida ao Tratado de Madri (1750), um dos principais tratados de limites, assinado por Portugal e Espanha para definir as áreas colonizadas.

O Tratado de Madri exigiu a transferência dos nativos para a margem ocidental do Rio Uruguai. Portugal e Espanha concordaram em trocar os Sete Povos das Missões, que ficou para Portugal, pela colônia do Sacramento que passou a pertencer à Espanha.

A decisão foi tomada por um acordo entre Portugal, Espanha e a Igreja Católica, enviando esta um emissário para impor a obediência aos nativos.

Os jesuítas viram-se numa situação delicada: se apoiassem os indígenas seriam considerados rebeldes; se não os apoiassem perderiam a confiança deles. Uns permaneceram ao lado da coroa, mas outros, como o Padre Lourenço Balda, da Missão de São Miguel, apoiaram os nativos, organizando a resistência desses índios à ocupação de suas terras e à escravização.

Os indígenas missioneiros opuseram-se à decisão do Tratado de Madri por não se considerarem bens permutáveis à disposição dos caprichos de monarcas europeus e por acreditarem que as terras lhes haviam sido reservadas por Deus, por intermédio de São Miguel Arcanjo.

Contrários às idéias da comissão deram início à luta por ação armada. Em janeiro de 1756, 1700 espanhóis e 1600 portugueses, rebocando 10 canhões, invadiram as Missões. Na Batalha de Caiboaté, momento culminante dessa guerra, centenas de missioneiros foram massacrados, poucas baixas se registrando nos exércitos invasores.

Foi-lhes fácil derrotar a desorganizada armada guarani, com seus canhões de bambu envoltos em couro, mobilizada em torno de seu herói o índio Sepé.

Sepé - Tiaraju foi um índio guarani de São Miguel das missões, que organizou guerrilhas para impedir o avanço dos exércitos português e espanhol na denominada Guerra Guaranítica, nos anos 1754-56.

Diz a lenda que quando Sepé morreu, ao preparar uma emboscada aos espanhóis na República dos Guaranis em 1756, os índios olharam para o céu e viram um cavaleiro galopando sobre um cavalo de fogo, envolto por uma luz muito intensa e com uma lança na mão. Era Sepé indo ao encontro de Tupã.

Essa derrota provocou a morte de muitos guaranis, assim como a destruição do trabalho de várias gerações, fazendo desaparecer uma enorme quantidade de índios catequizados.

Ao atravessar o pórtico da entrada das ruínas de São Miguel das Missões lê-se o brado heróico de Sepé-Tiaraju lá inscrito Co yvy oguereco yara, República dos Guaranis, hoje um lugar onde o passado e o futuro se encontram na memória histórica dos povos que concretizaram os sonhos e delinearam os destinos de um continente.

O tema das Guerras Guaraníticas tem muito a ver com os objetivos e ideais dos Clubes dos 21 Irmãos - Amigos no Brasil: integração dos povos, fé, esperança, caridade, defesa da unidade e identidade dos cidadãos. Foram valores como estes que transformaram o País na grandiosa Nação que hoje nos mantêm unidos.

Nas palavras do Profeta Daniel, “ao final dos tempos aparecerá Miguel, o grande príncipe que defende os filhos do povo Deus. E então os mortos ressuscitarão, os que fizeram o bem, para a Vida Eterna e os que fizeram o mal para o horror eterno”.

Diziam os índios guaranis ao tempo das Guerras Guaraníticas: “Esta terra tem dono. Ela nos foi dada por Deus e por São Miguel”.

Assim foi e assim será.

Os que fizerem o bem serão louvados

e os que fizerem o mal serão desprezados.

Mostra a história que a verdade sempre prevalece

e se perpetua na memória dos povos.

E se Deus é Brasileiro, como muitas vezes se afirma,

São Miguel é certamente Gaúcho.




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